18 junio, 2008

Eu sei que vou te amar y quiero que me perdonen los muertos de mi felicidad, Dindi.

Minhas tardes são sobre silêncio e páginas em branco - que, se Deus quere, vão se recheando ao longo das horas.

Vez ou outra, eu escuto, desde algum lugar da minha rua, músicas que algum vizinho escuta, em tom de eco, sempre na mesma altura, sempre o mesmo vento que traz; imagino que ele/a coloca a vitrola na varandinha da sala do seu apartamento, acende um cigarro e fica olhando o céu - ao menos sei que era isso que eu faria se minha casa tivesse uma varandinha e dela eu conseguisse olhar o céu. Sei que é uma vitrola porque às vezes eu escuto o ruído inconfundível da agulha no vinil quando se muda de faixa.

Semana passada, escutei "pequeña serenata diurna" num vento leste de verão, quente e imprudente, como quem busca uma saia pra levantar. Eu estava especialmente desiludida, na companhia de um hiato criativo insistente, mas foi uma grande tarde aquela: não falei com ninguém, desliguei o computador e fui escrever no papel (alguém lembra dele?) algumas notas sobre dois ou três assuntos, e de repente havia escrito três páginas inteiras sobre la gramatica de las multitudes. Não vai entrar na tese, mas vai entrar em alguma coisa, algum dia.

Hoje, 34 graus, dois litros de coca light e um banho de 40 minutos, ainda nenhuma palavra na página em branco. Pensei em me drogar com um livro de poesia do leminski, que já viajou continentes na minha mochila, já se molhou, já se enlameou, já serviu de travesseiro, já foi amado e odiado e sempre me serve quando nenhum ser humano.

Foi aí que escutei o violão bossa nova, só os seus baixos, vindo das paredes desde algum lugar direto pra minha cabeça. Tum tum, tum tum - me senti em casa - , olhei ao redor, procurando alguma coisa minha ligada... o ipod ligou só? Mestrado gera traumas? Meu vizinho conhece música brasileira e estava escutando "Eu Sei Que Vou Te Amar", do disco do Vinicius, Toquinho e Maria Creuza na Itália, onde ele recita o "Soneto de Fidelidade" enquanto ela cantarola...

Depois ele colocou o Tom cantando "Dindi" com o Frank Sinatra.

Entre o êxtase e o não-mover-um-dedo-pra-não-assustar-a-música-boa, decidi vir escrever sobre isso, aí ele/a colocou "Bem Devagar", numa versão velhíssima do Gilberto Gil. Melhor deixar de escrever baboseiras que ninguém vai ler e curtir o momento que não voltará.

No hay comentarios:

 

Roberta Gonçalves, 2007 - We copyleft it!