29 septiembre, 2008

A vida não me suborna mais

O joguinho de tarefa e recompensa que a Vida gosta de jogar com a gente não é por acaso. Viver é dar voltas pelo mundo buscando ser consentidamente subornado pela existência imensa, em nome da multiplicação da espécie, da vida gregária, da ordem mundial, do espírito humano ou, talvez no fim de tudo, seja mesmo em nome da arte... "The show must go on", gritam ébrias vozes panteônicas apontando ao coliseu azul.

(Tomem isso como exemplo: Está claro que sexo é uma troca suja de fluidos corporais, mas o sujeito vai encantado pra cama, engolir saliva alheia e passar a língua em locais nunca dantes cogitados. O importante é o prazer que ele te dá em troca - sexo, drogas e rock'n'roll são o viral que a Vida espalhou na internet cósmica, seduzindo almas flutuantes e incautas sobre as maravilhas de existir.)

Ocorre que agora a Grande Senhora dos Artifícios não me vê merecedora de seus pequenos subornos, emular a estadia humana por esse estágio de profanação da consciência em algo valoroso, pensa Ela, só interessa quando os sujeitos obedecem a um fim. Às vezes, o sujeito é tão desinteressante que Vida densa já não lhe oferece a peita, não vale a pena; minha fair share foi revogada por tempo indeterminado.

Mas alguém que salta à alienação da racionalidade que essas experiências sensoriais transitórias proporcionam simplesmente não suporta: a realidade não é vivível. Morre-se de ciência continuada.

Em outras palavras, o contentamento que vem das pequenas coisas, das grandes coisas, de qualquer coisa é a filhadaputês mais sarcástica que a Vida poderia haver inventado para fazer-nos dançar para ela. Mas é só quando Ela se deleita que se acendem fogos, a gente sente e é sentido, e tudo se mistura em lisergia, caleidoscopicamente e bem devagarinho.

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Roberta Gonçalves, 2007 - We copyleft it!